Pelo Dia da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Jesse Owens é um nome que deveria ecoar pelo passado, presente e futuro como um símbolo de coragem, superação e impacto global. Esse homem, cuja pele preta carregava os estigmas de uma época marcada pelo ódio, discriminação e sofrimento, merece mais do que lembranças: merece justas homenagens pelas marcas indeléveis que deixou na história do esporte e da humanidade.
Nas Olimpíadas de 1936, realizadas na Berlim nazista, Owens venceu quatro medalhas de ouro, desafiando não apenas os melhores atletas do mundo, mas também as ideologias racistas que tentavam afirmar a suposta superioridade de uma “raça ariana”. Ele triunfou com calçados insistentemente fornecidos pela empresa dos irmãos Dassler, que mais tarde se separariam para fundar duas das maiores marcas esportivas do mundo: Adidas e Puma. Ironia do destino, foi um atleta afro-americano, sob os olhares de Adolf Hitler, quem abriu as portas dessas empresas para um mercado internacional.
Além de suas conquistas esportivas, o impacto de Jesse Owens se estende muito além das pistas. As marcas que surgiram a partir do fornecimento de seus calçados arrecadam bilhões de dólares anualmente e geram milhões de empregos diretos e indiretos, sustentando famílias ao redor do mundo. Esse efeito econômico reflete o legado não apenas dos irmãos, mas da estrela Owens como um catalisador de mudanças, transformando sua presença em um símbolo de progresso e oportunidade.
Porém, o brilho de suas conquistas não apagou as injustiças que sofreu. Como ele mesmo relatou: “Não fui convidado para apertar a mão de Hitler, mas também não fui convidado para ir à Casa Branca para apertar a mão do presidente. Na verdade, foi Roosevelt quem me ignorou; nem mesmo um telegrama foi enviado”. Essa frase, de uma simplicidade cruel, expõe o racismo que transcendeu fronteiras, marcando não apenas a Alemanha nazista, mas também os Estados Unidos de antes, durante e depois.
Entre os momentos mais marcantes de sua jornada está a amizade inusitada com Luz Long, seu principal rival no salto em distância. Em um gesto de verdadeiro espírito esportivo, Long aconselhou Owens a ajustar sua técnica durante a classificação, ajudando-o a garantir a medalha de ouro. Mais tarde, Owens escreveu: “O que mais me lembro é a amizade com Luz Long. Apesar de ser meu rival mais forte, foi ele que me ajudou a ganhar”. O aperto de mão entre os dois, diante do público nazista, tornou-se um ícone de respeito e união.
Infelizmente, o retorno de Owens aos Estados Unidos foi um lembrete amargo de que suas vitórias não foram suficientes para quebrar as barreiras da segregação racial. “Depois de todas aquelas histórias sobre Hitler, voltei para o meu país e não pude entrar pela porta da frente do ônibus. E agora, qual é a diferença?”, disse ele em uma entrevista. Além disso, o preconceito e a falta de oportunidades o levaram a correr contra cavalos em shows para sustentar sua família. “As pessoas diziam que era humilhante para um campeão olímpico correr contra um cavalo, mas o que eu poderia fazer? Eu tinha quatro medalhas de ouro, mas não se pode comer quatro medalhas de ouro”.
O impacto de Jesse Owens vai além de sua época. Ele enfrentou e derrotou simbolicamente a raiz ideológica de uma guerra que destruiu milhões de vidas, demonstrando que a ideia de superioridade racial não passa de uma falácia. Suas conquistas também anteciparam um mundo onde os direitos humanos se tornariam centrais, culminando na criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, cujo aniversário celebramos com o entendimento de que a luta por igualdade continua relevante. Hoje, ao olharmos para o mundo, com seus conflitos e persistentes preconceitos, é evidente que a mensagem de Owens ainda é um farol de esperança e resiliência.